domingo, 21 de março de 2010

Os lírios e as relações




Em um post anterior eu já escrevi sobre as plantinhas q eu cuido. Não, esse blog não vai virar um blog de jardinagem, mas eu tenho descoberto e aprendido coisas sobre a vida nessa relação.
Eu convido vocês, então, à compartilhar comigo essa experiência e, quem sabe, descobrir junto comigo pequenas coisas que podem fazer diferença nos nossos encontros com o outro.

Pra quem não sabe, eu criei uma relação com uma roseira, duas orquídeas, um ciclamen, um coqueiro e 4 lírios em um vaso. Quando eu cheguei aqui em setembro, comecei a cuidar delas como uma forma de, talvez, não me sentir sozinha. E de fato não estou!
Não virei expert no cuidado dessas espécies, na verdade é um aprendizado constante. Mesmo q elas tenham vindo com algumas instruções, a gente tem que levar em conta as condições e características daquela planta específica e não só da sua espécie. Tive q observar e adaptar essas instruções de acordo com a temperatura do local, da umidade do ar, da exposição à luz do local em um jogo de acerto e erros.
O mais gostoso dessa relação é descobrir que elas me respondem, nem sempre como eu gostaria, mas sempre de acordo com a forma que eu as trato.
Acho que essa foi a primeira coisa que aprendi com as minhas plantinhas e que na vida, com pessoas, poderei aplicar também.

Sem menosprezar os grandes ícones da Psicologia que muito me ensinaram através dos livros, eu tenho aprendido sobre ''a relação com o outro'' e uma outra ''Psicologia'' observando a Natureza.

Todo dia, quando eu acordo, vou dar bom dia à minhas queridas e verificar se tudo vai bem com elas. Observo se a terra está seca, se as folhas estão secando, se estão surgindo novas folhas, enfim, quero garantir que elas tenham tudo o que precisam pra continuarem bem.

Não faz muito tempo, comentei que meus lírios tinham florido logo depois que eu tinha chegado em Bruxelas. Uma das minhas orquídeas estava toda florida, o ciclamen e a roseira também. Todas estavam lindas! Isso me deu mais vontade de cuidar e fazer 'de tudo' para mantê-las sempre bonitas. Eu estava vendo uma linda resposta aos meus cuidados diários.
Com o tempo, essas mesmas plantas seguiram seu ciclo natural: as flores murcharam, as folhas da roseira caíram e o inverno chegou. Isso me deixou triste, pois era uma imposição da Natureza e eu não tinha controle. Daí eu pensei: "Vou fazer tudo o que depender de mim para que elas voltem à ficar como estava antes, floridas!"

Nesse momento começa o segundo aprendizado que vocês vão saber no final do próximo parágrafo.

Antes de viajar por uma semana em janeiro, eu fiquei preocupada de como 'elas ficariam sem meus cuidados'. Não confiaria aos meus roomates essa tarefa, pois eles certamente não fariam 'com tanto carinho' como eu. Optei então pela abundância, peguei um pouco de neve que tinha no quintal e coloquei no prato para elas absorverem aos poucos. A princípio me pareceu uma boa idéia, coloquei uma quantidade de acordo com o tamanho do vaso. GRANDE ERRO que só fui perceber tempo depois! Voltei de viagem e continuei regando-as regularmente, como fazia antes. Com o tempo, fui percebendo que meu lírio estava ficando amarelado, achei q fosse efeito do inverno e quando a temperatura aumentasse ele iria ficar verdinho de novo. Na verdade, meu lírio estava morrendo e eu não sabia. Ele estava me dando sinais de que não ia bem e eu não vi. Continuei regando, então, sempre q via a superfície da terra um pouco seca, achando que aquilo fazia parte do ciclo normal de vida dele. Mero engano, ele já tinha morrido e eu não tinha percebido.

Quando procurei saber as fases do lírio na internet, me dei conta que eu tinha provocado a morte dele. Mas como assim? Foi na melhor das intenções, foi por amor, foi pensando justamente em não deixar faltar o que ele precisava... Eu tinha me esquecido que o excesso também é um erro. Aqui não vale a frase "Prefiro pecar pelo excesso do que pela falta". Que tolice, ele estava morto. Pecado é pecado.

Nas relações não é diferente. Quantas vezes já não ouvimos de pessoas que nos amam essa frase? Quantos de nós já não citou essa frase? Quem nunca teve medo dele não sobreviver se não estivermos por perto (e vice-versa)? Quantas vezes 'por amor' a gente não deixa faltar nada, pelo contrário, oferecemos demais àquele que amamos, até mesmo o que ele não precisa e nem quer? Mas o demais é demais! Quem de nós, apesar dos sinais do outro, insistiu que tudo estava sob controle e não conseguiu/quis ver a falência de uma relação ?

Por dois meses eu fiquei triste olhando aquele vaso vazio e me culpando de não ter sabido cuidar daquela plantinha que alegrava meus dias e era tão linda quando eu cheguei em Bruxelas. Aprendi.
Deixei o vaso intacto e pensava em reaproveitar aquela terra que ainda estaria fértil, mas não sabia se daria certo.

Essa semana resolvi mexer na terra e tive uma linda surpresa: encontrei um broto! Não me perguntem como isso aconteceu, como disse no início do post, não sou expert. Só sei que ele está lá, pequenino e verdinho. Também não sei se é de lírio, não sei como eles se reproduzem. Pode ser.. ou não. Só sei que naquele vaso vazio, ainda tinha uma terra fértil que deu vida à uma nova plantinha.
Talvez com nosso coração seja assim também, com nossas relações: pais e filhos, amigos, amores...

Só sei que essa nova plantinha está sendo cuidada, dessa vez sem 'mais nem menos'. Acho que assim pode dar certo, vamos descobrir com o passar do tempo.

Tudo isso é pra dizer que eu aprendi que podemos matar uma relação ou se deixar morrer em nome do amor e com atitudes erradas. As plantas tem ciclos, assim como nós tb. Elas nos dão a beleza das flores, depois entram numa fase mais 'feia' de latência. Mas elas não estão mortas, nem precisamos dar ''mais'' pra ela voltar logo a ser bonita. Precisamos sim, entender essas fases e dar o que elas precisam naquele momento. Talvez um pouco de adubo.
Uma relação é assim, já dizia o ditado: "No início, tudo são flores". E são, mas depois ela entra em outra fase importante e, se for cuidada na medida certa, poderá florir novamente.
Como psicóloga com enfase no cultivo de plantas, eu sugiro a todos que cultivem plantas! É um bom treinamento pra saber se vc consegue manter uma relação 'na medida' certa.
Observe sua planta, veja se ela não está muito exposta, se ela não está secando ou se afogando.. Mesmo com a melhor das intenções ela pode morrer. Observe os sinais, coloque em questão a sua forma de cuidado e a forma como ela te responde.
Coloque-se também no lugar dela também. Nas relações, todos somos plantas e cuidadores ao mesmo tempo.
E se a plantinha morrer, não desista. Faz parte do aprendizado. O coração é uma terra fértil e pronta para cultivar outroas amores que brotarão sem você perceber!

Passo agora a palavra aos meus amigos psi's e não-psi ....

Beijo grande

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PS: Obrigada Lu, que sempre me encoraja à escrever!